“Eu sou quem eu quero ser”. Essa é a abordagem defendida pelo movimento Mães Pela Igualdade,
grupo formado por mães de homossexuais que atuam no combate à
homofobia. A fundadora do movimento é a pernambucana Leonora Pereira,
que idealizou o projeto após seu filho – José Ricardo, de 24 anos – ser
assassinado em 2010. O caso teve um desfecho em julho deste ano, com a
primeira condenação no país por crime de homofobia. Agora, o Piauí
também possui um núcleo do movimento sob coordenação da professora
universitária aposentada Lurdinha Nunes, que explica que o grupo luta
pelos direitos de seus filhos terem a sua livre orientação sexual
vivenciada respeitada.
“As
pessoas exigem sempre uma cobrança de querer justificar tudo como se
fosse um mal-entendido, mas nesse caso isso não existe. Aqui é um bem
entendido mesmo. É a coragem de dizer ‘eu sou quem eu quero ser’”,
disse. No Brasil, existem dois grupos: Mães Pela Igualdade, presente em
todo país e o Mães Pela Diversidade, presente no eixo Rio de Janeiro e
São Paulo, mas com o mesmo propósito de lutar pelos direitos de seus
filhos e fazer com que a sociedade entenda que eles representam uma
família. “As pessoas não observam, ignoram a população LGBT e não
conseguem imaginá-los com uma vida própria, como alguém produtivo na sua
essência e não por sua sexualidade”, disse.
O grupo defende um
olhar de família que apoia e respeita seus filhos. As lutas possuem
várias frentes que variam desde a produção de materiais didáticos como
livros e cartilhas para distribuir nas comunidades e promovem a
orientação para as pessoas; assim como o debate político realizando
discussões com grupos para que possam respeitar os direitos do público
de lésbicas, gays, bissexuais, travestis, transexuais e transgêneros;
articulação política, já que os movimentos que têm os mesmos princípios
se unem para articular com senadores e deputados federais a criação de
leis que trabalhem pelas causas do público e também um trabalho de apoio
às mães “Nós temos uma sociedade que foi orientada para entender a
heteronormatividade, quer dizer, só é normal aquilo que é o homem e a
mulher, então o que tem que ser defendido é que existem diversas formas
de ser e de amor e isso tem que ser respeitado”, acrescentou. Ela
completou afirmando que o primeiro contato com as mães é para escutar
como foi a descoberta da orientação sexual dos seus filhos que pode
acontecer de diversas formas.
Apoio da família reflete na sociedade
O
coordenador do Centro de Referência LGBT do Piauí e presidente do
Conselho LGBT de Teresina, Vitor Kozlowski, afirmou que é de suma
importância a participação de um movimento em que mães de homossexuais
se unem para lutar pelos direitos dos seus filhos e de todo público.
“A
possibilidade de ter mães que se organizam para defender os direitos de
seus filhos é imensamente importante, pois um dos espaços em que há
grande discriminação da população LGBT é justamente dentro de casa e
quando existe esse diálogo e a defesa dessas pessoas no seio familiar é
realmente algo que pode contribuir diretamente no enfrentamento à
discriminação da sociedade em geral”, destacou.
Ele acrescentou
que o impacto para crianças, adolescentes e jovens homossexuais que têm o
apoio e respeito dos pais dentro de casa desde cedo é fundamental na
luta pelo respeito e livre orientação sexual de casa. Isso porque
reflete diretamente na construção de uma sociedade mais tolerante e
menos preconceituosa.
“Esse impacto é imenso. Se partirmos do
princípio de que as denúncias de violação de direitos registradas no
Disque 100 e outros dados de violência contra o LGBT apontam que a maior
parte dos discriminados são jovens, a recepção e o entendimento da
sexualidade de cada membro da família resultaria para um reflexo
positivo na luta contra o preconceito”, considerou.
Vitor
Kozlowski ressalta que o Mães Pela Igualdade é bastante valioso para o
movimento e luta LGBT, pois soma com os ideais por entenderem as suas
necessidades e conhecerem sua realidade.
Respeito pela identidade
A
doutora em Educação Lurdinha Nunes também é uma forte militante dos
Direitos Humanos e isso lhe fez entender que o mais importante é o
respeito pela identidade da pessoa. Isso a ajudou no momento em que sua
filha contou, aos 13 anos de idade, que gostava de outra menina.
“Eu
tenho um histórico de defesa dos direitos humanos e nessa trajetória eu
sou parceira do movimento LGBT há 14 anos, então eu passei a conviver
com aquela realidade. Quando minha filha me contou, eu entendi que Deus
me preparou para aquele momento que ela me disse qual a sua orientação
sexual”, revelou.
Ela acrescentou que já esperava por esse momento
e, a partir de então, passou a estudar ainda mais sobre a causa. Ela se
preparou para as palestras para ter um entendimento maior social e
político e começou a realizar o trabalho de conscientização pelo
respeito da orientação sexual da sua filha dentro de casa com familiares
e amigos. Foi quando começou a se infiltrar ainda mais em questões
sobre a temática.
Números de denúncias contra público LGBT assustam
A
Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República realizou um
levantamento a partir de denúncias feitas por telefone e registrou 3.084
denúncias de 9.982 violações relacionadas à população LGBT, envolvendo
4.851 vítimas e 4.784 suspeitos. Os números confirmam uma outra análise
que revela uma média de 3,23 violações sofridas por cada uma das
vítimas.
O cenário se torna ainda mais preocupante se levarmos em
consideração os dados relacionados à violência em geral e violência
particular. Muitas vezes, ocorre a naturalização da violência como único
tratamento possível ou a autoculpabilização. Essa estatística está
relacionada às violações analisadas pelo levantamento e não corresponde à
totalidade das violências ocorridas cotidianamente contra LGBTs, que
segundo especialistas e estudiosos são muito mais numerosas do que
aquelas que chegam ao conhecimento do poder público.
Os números
apontam para um grave e assustador quadro de violências homofóbicas no
país já que reportaram 27,34 violações de direitos humanos de caráter
homofóbico por dia. A cada dia, 13,29 pessoas são vítimas de violência
homofóbica reportada no Brasil. O estudo foi realizado no ano de 2012.
“Orientação sexual é só uma parte da pessoa, não é o todo”, defende mãe
Leonora
Pereira ressalta que ainda existe um debate muito forte de que “agora,
todos têm que ser homossexuais” e exemplifica que uma pessoa que é a
favor da causa indígena não precisa ser índio ou até mesmo se é contra o
racismo não vai se tornar negro. Para ela, falta sensibilidade nas
pessoas.
“A
sensibilidade parte do respeito à dignidade da pessoa. O respeito
àquilo que a pessoa é, representa, a sua história, trajetória, a memória
de sua família e os sonhos e desejos que aquela pessoa tem. Afinal todo
mundo tem o direito de ser feliz e orientação é só uma parte da pessoa,
não é o todo”, declarou.
A idealizadora do projeto destacou a
importância de eventos como a Parada da Diversidade em Teresina – que
reuniu 110 mil pessoas na edição de 2015. Neste ano, o grupo formado por
12 mães participou pela primeira vez do evento e o movimento já tem uma
lista com cerca de 20 municípios piauienses para visitar e realizar
palestras no intuito de conseguir a inserção de novos apoiadores.
O
grupo se reúne a cada 15 dias como família e têm entre seus membros o
mesmo sentimento: amor de mãe. Todas se sentem mães de todos, pois
sentem e conhecem o sofrimento dos seus filhos em relação ao preconceito
que sofrem e por isso criam um sentimento de identidade.
Fonte: Meio norte
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