Aprovação ocorreu um dia após PEC semelhante ser derrubada na Casa. Idade penal reduz para 16 anos em homicídio, lesão grave e crime hediondo.
Apenas 24 horas após o plenário rejeitar a redução da maioridade para crimes graves, a Câmara
dos Deputados colocou novamente o tema em votação e aprovou na
madrugada desta quinta-feira (2) a Proposta de Emenda à Constituição
(PEC) que reduz de 18 para 16 anos a idade penal para crimes hediondos,
homicídio doloso e lesão corporal seguida de morte. A manobra do
presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ),
revoltou deputados contrários à mudança constitucional, gerando
intensas discussões. Para virar lei, o texto ainda precisa ser apreciado
mais uma vez na Casa e, depois, ser votado em outros dois turnos no
Senado.
A votação da madrugada desta quinta se deu com 323 votos favoráveis,
155 contrários e 2 abstenções. Eram necessários ao menos 308 votos a
favor para a matéria seguir tramitando.
De acordo com o presidente da Câmara, a votação em segundo turno deverá
ocorrer após o recesso parlamentar de julho, já que é preciso cumprir
prazo de cinco sessões antes da próxima votação.
Pelo texto, os jovens de 16 e 17 anos terão que cumprir a pena em
estabelecimento penal separado dos menores de 16 e maiores de 18. Ao
final da votação, deputados favoráveis à mudança constitucional
seguraram cartazes na tribuna em defesa da proposta e comemoraram com
gritos em plenário
Proposta rejeitada um dia antes
A aprovação da PEC ocorre depois de a Casa derrubar, na madrugada da última quarta-feira (1º),
texto semelhante, que estabelecia a redução da maioridade a casos de
crimes cometidos com violência ou grave ameaça, crimes hediondos (como
estupro), homicídio doloso, lesão corporal grave ou lesão corporal
seguida de morte, tráfico de drogas e roubo qualificado.
Após a rejeição na noite anterior, Cunha afirmou que a Casa ainda teria
que votar o texto principal, mas ressaltou que isso só ocorreria após o
recesso parlamentar de julho. No entanto, após reunião com
parlamentares favoráveis à redução da maioridade penal, ele decidiu
retomar a análise do tema nesta quarta e apreciar um texto parecido com a
proposta rejeitada.
Sem protestos
Jovens da União Nacional dos Estudantes (UNE) e da União Brasileira dos
Estudantes Secundaristas (Ubes) não esperavam a retomada da votação e,
por isso, não conseguiram fazer protestos como os mobilizados na noite
anterior.
Cunha também não permitiu a entrada dos poucos estudantes que foram à
Câmara para defender a derrubada da proposta, alegando que os
manifestantes fizeram tumulto na noite anterior.
A decisão do presidente da Câmara de votar um texto semelhante ao
derrotado de madrugada também gerou bate-boca e questionamentos por
parte de deputados contrários ao texto, mas o peemedebista conseguiu
prosseguir com a votação.
Como foi a votação
Durante a sessão, deputados do PT, do PSOL
e do PCdoB defenderam a derrubada da PEC. O governo defende alterar o
Estatuto da Criança e do Adolescente e ampliar o tempo máximo de
internação de 3 para 8 anos.
“Todos nós queremos resolver a questão da violência, da criminalidade,
queremos evitar que crimes bárbaros terminem. Mas precisamos, de forma
madura e responsável, encontrar qual a alternativa real para resolver o
problema. E a alternativa real é alterarmos o Estatuto da Criança e do
Adolescente. Os efeitos colaterais dessa redução da maioridade penal são
maiores que os alegados benefícios”, disse o deputado Henrique Fontana
(PT-RS).
O líder do governo, deputado José Guimarães (PT-CE), também discursou
contra a proposta. “Não queremos jovem infrator na rua, mas queremos
lugares decentes para que eles sejam punidos. Mas não dá para misturar
os jovens com bandidos de alta periculosidade. O que está em jogo é o
futuro dessas gerações. É um retrocesso se aprovarmos essas emendas”,
afirmou.
Já parlamentares favoráveis à redução da maioridade penal argumentaram
que a PEC não soluciona o problema da violência, mas reduz o sentimento
de “impunidade”.
"Nós sabemos que a redução da maioridade penal não é a solução, mas ela
vai pelo menos impor limites. Não podemos permitir que pessoas de bem,
que pagam impostos, sejam vítimas desses marginais disfarçados de
menores", discursou o líder do PSC, André Moura (SE).
O líder do PMDB, Leonardo Picciani (RJ), um dos articuladores da
votação nesta quarta, também defendeu a redução da maioridade penal. "O
PMDB afirma a sua posição de maioria pela redução da maioridade penal,
nos crimes especificados. Achamos que a proposta é equilibrada, ela é
restrita", disse. “A sociedade não aceita mais a impunidade e não deseja
mais sentir o medo, o pavor e o receio que vem sentindo no dia a dia.”
Emenda apresentada na quarta
A proposta derrubada nesta quarta é produto de uma emenda aglutinativa –
texto produzido a partir de trechos de propostas de emenda à
Constituição apensadas ao texto que está na pauta do plenário.
Essa emenda foi elaborada pela manhã por deputados do PSDB, PHS, PSD e PSC
e protocolada na Secretaria-Geral da Mesa. No plenário, deputados do
PT, do PDT e do PCdoB alegaram que a elaboração de uma proposta com teor
muito semelhante ao texto derrubado contraria o regimento. Argumentaram
ainda que, para ser votada, a emenda teria que ter sido elaborada e
apensada antes da votação ocorrida durante a madrugada.
Cunha rebateu os argumentos citando o artigo 191, inciso V, do
regimento interno da Câmara. Conforme esse trecho, na hipótese de
rejeição do substitutivo (texto apresentado pelo relator da proposta,
como é o caso), “a proposição inicial será votada por último, depois das
emendas que lhe tenham sido apresentadas”.
Segundo o peemedebista, como o texto original ainda não havia sido
votado, é permitida a apresentação de novas emendas aglutinativas com
base nas propostas apensadas a essa redação.
Os parlamentares continuaram a protestar e Cunha chegou a bater boca
com eles. “Quando o senhor é chamado de autoritário, o senhor se
chateia”, protestou o deputado Glauber Braga (PSB-RJ). Cunha rebateu: “Ninguém vai vencer aqui no berro”.
“Não imagine que o senhor vai nos escravizar, porque não vai. Não
imagine que todos os parlamentares vão abaixar a cabeça”, emendou Braga.
O deputado Weverton Rocha (PDT-MA)
acusou Cunha de “aplicar um golpe”. A deputada Erika Kokay (PT-DF)
chamou o presidente da Câmara de Luiz XIV, em referência ao rei francês
absolutista, e disse que ele tentava sobrepor a sua vontade à dos
parlamentares.
José Guimarães (PT-CE) fez um apelo para que a votação fosse suspensa e
a Câmara discutisse como alternativa um projeto de lei que tramita no
Senado ampliando de 3 para 10 anos o período máximo de internação de
jovens infratores.
Segundo ele, “uma discussão tão importante como essa” não poderia ser
tratada “com tamanho radicalismo”. Guimarães argumentou ainda que a
aprovação da emenda poderia trazer “sequelas”.
“Reverter [a posição] de ontem para hoje é o melhor caminho? Claro que
não, porque pode deixar sequelas”, disse sobre o impacto da redução. No
entanto, Cunha não cedeu e continuou a sessão. Os parlamentares
contrários à redução da maioridade tentaram, então, obstruir a sessão,
utilizando-se de manobras previstas no regimento para postergar ao
máximo a votação.
Fonte: G1
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