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segunda-feira, 10 de março de 2014

Baixaria’ entre candidatos é a maior preocupação da Procuradoria Geral Eleitoral

‘Na campanha, deveria prevalecer o embate objetivo de ideias e perspectivas’, diz Eugênio Aragão.

Não são as milícias, muito menos os traficantes. Nem mesmo o financiamento irregular das campanhas, o chamado “caixa 2”. O que realmente vai tirar o sono da Procuradoria Geral Eleitoral nas próximas eleições de outubro é o ataque pessoal entre os candidatos. Em entrevista ao GLOBO, o vice-procurador Eleitoral, Eugênio Aragão, revela que o “ambiente de tensão” entre os concorrentes será o maior desafio. Segundo ele, o Ministério Público “deve evitar se transformar em mais um componente de tensionamento“.

- Na campanha, deveria prevalecer o embate objetivo de ideias e perspectivas, mas infelizmente parece que os confrontos se concentram muito nos aspectos subjetivos, pessoais - afirmou Aragão.


No cargo desde 17 de setembro do ano passado, Eugênio Aragão disse que o fato de os pré-candidatos condicionarem suas agendas em ritmo de campanha deve ser visto com “naturalidade”:

- Ninguém é candidato de uma hora para outra. Parece lógico que haja o jogo de articulações prévias para viabilizar as candidaturas e também parece lógico que a imprensa acompanhe esse jogo de articulações atentamente.

Leia a entrevista na íntegra:

O que mais preocupa o senhor nesta eleição? Por quê?

O que mais preocupa é o ambiente de tensão que se desenha nas diversas frentes de candidatos. Na campanha, deveria prevalecer o embate objetivo de ideias e perspectivas, mas infelizmente parece que os confrontos se concentram muito nos aspectos subjetivos, pessoais. É claro que essa característica do atual processo político aumenta o risco de incidentes de maior magnitude, invadindo a seara penal e de vedações eleitorais. Manter o ambiente eleitoral seguro e tranquilo, com garantia do livre debate de ideias e programas e com igualdade de chances entre os candidatos é nosso maior desafio. O Ministério Público deve evitar de se transformar em mais um componente de tensionamento desse ambiente, agindo com equilíbrio e não aceitando ser instrumento de embate interpartidário. Sua missão não deve se confundir com a agenda dos candidatos e sua intervenção deve ser transparente e certeira. E por isso que estamos trabalhando.

Os pré-candidatos à Presidência da República e aos governos estaduais já estão nas ruas em ritmo de campanha. Como fiscalizá-los antes do período permitido por lei?

Os movimentos dos potenciais candidatos devem ser vistos com naturalidade. Ninguém é candidato de uma hora para outra. Parece lógico que haja o jogo de articulações prévias para viabilizar as candidaturas e também parece lógico que a imprensa acompanhe esse jogo de articulações atentamente. Apesar disso, é vedado, neste momento, o pedido de votos, a promoção pessoal e atos de propaganda propriamente ditos. O Ministério Público Eleitoral está atento em todo o Brasil para evitar esse tipo de campanha precoce e, se necessário, serão propostas as ações respectivas para evitar quaisquer desvios. É claro que tudo isso deve ser contrabalançado com a consciência de que a comunicação de ideias e críticas, mesmo numa perspectiva da futura eleição, é inevitável. A garantia da liberdade de expressão dos pré-candidatos de um lado e a necessidade de se coibir, de outro lado, a propaganda prematura, é um equilíbrio difícil entre valores importantes, e que será a nossa preocupação constante.

As recentes infrações cometidas por pré-candidatos demonstram que este problema está banalizado? Por quê?

Até agora, todas as representações feitas por um grupo contra outro têm sido rechaçadas, no que diz respeito à atuação de pré-candidatos presidenciais. Por outro lado, a relativa maior exposição de candidatos que ocupam cargos executivos é natural, o que não significa que o Ministério Público não esteja atento a abusos que possam eventualmente ocorrer. Essa exposição, aliás, tem sido compensada largamente pelo noticiário equilibrado na mídia, que tem tratado os pré-candidatos, em geral, de forma bem igualitária. Nos estados, as Procuradorias Regionais Eleitorais estão vigilantes, tendo sido propostas várias ações por desvirtuamento da propaganda partidária e também ações por propaganda eleitoral extemporânea.

Áreas dominadas por milicianos e por traficantes são sempre um problema no período eleitoral. Qual será o seu trabalho em relação a isso? Haverá medidas concretas? Quais?

A segurança das eleições é tratada em nível estadual. Se o executivo estadual, as Procuradorias Regionais Eleitorais e a Justiça Eleitoral detectarem dificuldades para garantir a segurança do pleito, poderão pedir a presença da Força Nacional. Por enquanto, se está a observar o cenário e o trabalho é de articulação com os Procuradores Regionais Eleitorais, que não hesitarão em pedir ajuda se necessário.

O que o senhor pretende fazer para combater o financiamento irregular de campanha?

Nós sabemos que esse é um ponto sensível na campanha, mas eventual irregularidade é muito difícil de se identificar com os mecanismos tradicionais, como a mera fiscalização nas prestações de contas dos candidatos, por exemplo. Normalmente o Ministério Público atua quando tem notícia de uso indevido de recursos públicos ou irrigação de campanhas com ativos de origem duvidosa. Para o êxito desse trabalho, torna-se imprescindível o contato permanente com autoridades policiais e de inteligência financeira, o que já ocorre, mas que pretendemos intensificar. A fiscalização de contas eleitorais deverá contar com uma ação concertada entre os procuradores regionais e promotores eleitorais em todo o país, com o apoio do Banco Central e do COAF (Conselho de Controle de Atividades Financeiras). Ainda não temos a alimentação eletrônica online das planilhas de entradas e saídas, mas estamos trabalhando nisso. Ponto positivo dessa articulação desenvolvida em conjunto com os Procuradores e Promotores eleitorais foi o combate à doação eleitoral acima dos limites fixados em lei, que gerou milhões de reais em multas pelo descumprimento em todo o país.

Os Tribunais Regional Eleitorais (TREs), na sua opinião, têm condições para fiscalizar as irregularidades? Por quê? O que deveria ser feito para resolver este problema?

O esforço de fiscalização das eleições deve ser conjunto, pois o Brasil é um país de dimensões continentais. Todos têm um papel: a Justiça Eleitoral, o Ministério Público Eleitoral, a Polícia Federal e, especialmente, os eleitores. A Justiça Eleitoral exerce o poder de polícia administrativo, mas que obviamente não transforma o juiz eleitoral em inquisidor. Cabe ao Ministério Público Eleitoral receber as notícias de irregularidades e propor as ações que acarretam sanções, respeitando o devido processo legal e o papel imparcial do juiz. A Polícia Federal tem um papel importante na área eleitoral, especialmente na apuração de condutas opacas como o “caixa 2” e a “compra de votos”. Finalmente, não se pode desprezar o auxílio fundamental do eleitor. Esse é o fiscal mais eficiente, porque imbatível em capilaridade, sendo parceiro constante do Ministério Público Eleitoral. Devemos trabalhar com campanhas educativas para estimular essa participação fiscalizadora.

Fonte: O Globo



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